domingo, 31 de maio de 2009

Sombras na Parede - Último Capítulo

- Rafael e Helô -

- Eu tenho um plano pra gente ficar sempre junto.

Os irmãos estavam no alto do prédio, contemplando a solidão a dois que não era mais capaz de confortar o segredo descoberto.

-Eu acho que não podemos fazer mais nada - disse Rafael - eu quero morrer.

- É isso.

- O quê?!

- Não faz mais sentido ficar aqui. Nós perdemos a nossa casa. Nós perdemos a nossa mãe. Não consigo mais olhar para ninguém sem me sentir culpada. O que você pensa em fazer?

- Eu não sei Helô! Você está falando sério sobre...

- Morrer? Claro. Você viu.. a mamãe já contou tudo para o nosso pai e deve contar para outras pessoas também. Ela pensa que nós precisamos de ajuda, mas no fundo, está estragando tudo. Se nós morrêssemos agora, tudo isso estaria resolvido.

Rafael tentou contradizer a irmã mas não conseguiu. Ele não via mais sentido em viver. Ele sentia nojo de tudo que havia feito. Amor e humilhação o deixavam nauseado diante de tudo. Sentia medo. Sentia ódio. Sentia frio. Percebeu que também sentia vontade de morrer. Sentia vontade de pular. Pulou. A queda vai durar 7 segundos. Respire. Pense em traição. Pense na liberdade do voo. Pense na sentença de morte. Passaram 7 segundos.

Sirene, corpo, lágrimas, mentiras.

- Mãe, eu não consegui fazê-lo mudar de ideia. Ele se suicidou por sua culpa.

- Miriam e Vanessa -

Dois meses após o suicídio de Rafael, Vanessa está no quarto de Miriam.

- A mãe do Rafa enlouqueceu. Fico com pena da Helô... um irmão suicida, a mãe no manicômio. Ela deve estar sofrendo demais. Só em pensar que eu já namorei aquele imbecil... ele não sabia o quanto vale uma vida.

Vanessa não consegue ouvir o que Miriam diz. Ela está aflita e precisa de ajuda.

- Miriam, onde você fez o aborto?

Fim?

Não há fim.

Porque a miséria humana é um ciclo interminável.

sábado, 23 de maio de 2009

Sombras na Parede - Capítulo 4 ou Penúltimo

- Helô e Rafael -

Os irmão mantinham uma relação de afeto muito grande e discutiam incansavelmente ao mesmo tempo. Era estranho aos olhos da mãe. Ainda se eles tivessem assunto em comum para tanta discussão... mas não havia. Quando a existência dos dois era um segredo, eles se amavam intensamente. Era algo que não lhes era permitido:

- E se alguém descobrir?

Na casa de campo, se escondiam por entre os arbustos com cheiro de vida, deitavam cobertos pela sombra caridosa de uma árvore inocente e se amavam. Os encontros tornavam-se então inevitáveis, imunes à fuga. Corriam riscos, sentiam medo, se entregavam. As relações paralelas eram apenas diversão, logo, necessárias. Eram seguras, podiam ser flagradas. Havia o ciúme, duplo. Fraterno e amante. E hoje, a mãe de Rafa e Helô os deixou a sós. Foi a um jantar na casa de uma amiga. Os irmãos estão deitados na cama de casal forrada com estampa de anjos e conversam sobre coisas tolas. Sem saber que a mãe se esqueceu do vinho que havia prometido para o jantar e está voltando para buscá-lo, eles respiram indiscretamente o suposto amor imoral.

- Você gosta mesmo daquela menina?
- Não.

Helô só perguntava aquilo que já sabia a resposta.
Não havia mais espaço para perguntas, os corpos ansiavam por um encontro íntimo. No êxtase do momento, eles mal podem ouvir os passos da mãe subindo a escada. Atraída pelos gemidos vindos do seu quarto, a mãe se aproxima da verdade que irá destruir a sua família. Após três passos, ela terá o coração condenado a ser infeliz.

Um.
Dois.
Três.

Os gritos da mãe não puderam ser ouvidos por Rafael. Tudo o que ele via parecia ser monocromático. Cinema mudo. Era sintoma de desespero. Viu a mãe agarrar os cabelos da filha, enchendo-a de tapas e arranhões. Fração de segundo depois, se viu no meio de tudo isso. Estava sendo arranhado no rosto, mas não sentia. Doía demais por dentro. Os três gritavam. Não conseguiam formar palavras. Tudo havia sido descoberto. O pecado indecifrável estava aos pés da cama, recoberto de lágrimas e gotas de sangue. Crime exposto. Humilhação. As forças acabaram. A luta corporal também. Impossível parar de chorar. Estão completamente arruinados. Não resta mais nada a fazer. Estão amontoados. Três almas violentamente condenadas projetam na parede a sombra de um abraço recoberto de afeto e perdão. Helô sem querer derruba o abajur, a luz se apaga e o abraço projetado se desfaz.