- Às vezes a gente vê estrelas que já se apagaram há muito tempo. Para o nosso desespero, existe a distância.
- E quando as ilusões acabarem, o que vai acontecer?
- Você vai perceber que não está mais viva.
- O que é mais difícil para você: o sentimento ou a ação?
_ Eu estava sentado, montando um quebra-cabeça e me flagrei pensando em você. Meus olhos ficaram cheios d'água. É que eu sou tão tímido que fiquei com vergonha de você saber disso um dia. É que eu tenho tanta esperança, que fiquei com medo de que você nunca soubesse desses pensamentos que tenho ao seu favor. São apenas hipóteses que tentam inutilmente justificar essa umidade em torno dos meus olhos. Não sei se estou comovido, não sei se estou triste. É tudo tão claro e tão confuso ao mesmo tempo... É que gostar de alguém, do jeito que eu gosto de você, é uma coisa nova pra mim. E eu queria tanto, tanto, que você me adivinhasse, que você pensasse igual. Então não seria preciso eu passar pelo vexame de dizer que eu sou louco por você. Sinto ciúme e você nem sabe. Desde o primeiro dia em que te vi, eu quis te ver pra sempre. Estou sendo ridículo? Previsível demais? Talvez exagerado? Não!? Não imaginava que eu estivesse terrivelmente apaixonado por você? Eu não correspondi a todas as suas indiretas? É que eu sou péssimo pra isso! E eu tive medo de me entregar tão fácil a ponto de te frustrar, ou então parecer vulgar ou só mais um qualquer... Eu ensaiei tanto ontem pra te falar tudo isso! Não, não é que não seja verdadeiro. Foi só pra não esquecer nadinha de tudo o que eu queria te dizer. Ensaiei tanto que o espelho lá de casa deve ter ficado entediado! Agora eu estou aqui, na sua frente, possivelmente com cara de bobo, esperando você dizer alguma coisa antes que eu morra de vergonha, de alegria, de ansiedade, de tudo! Vai, diz alguma coisa!
Havia um cantor e compositor que falava diretamente comigo. Era sem querer, obviamente, mas era íntimo. Queria tê-lo ao meu lado sempre que sentia aquela angústia, aquela vontade de ligar para o meu amor imperfeito, de corrigi-lo e, no final das contas, piorá-lo. E queria tê-lo sempre que me sentisse radiante, com a alma aquecida. Afinal, ele era um amigo para todas as horas. E numa noite dessas, em que não temos nada pra fazer, ele se sentaria ao meu lado com o seu violão e tocaria aquela música que fala da chegada do inesperado, um segundo sol pra aquecer a minha vida, que ilumina aquilo que não se pode entender, só sentir. Depois falaria do all star azul de uma amiga e do bairro das Laranjeiras. Falaria ainda por meio de músicas pouco conhecidas... Monóico para apimentar, Como se fosse o mar para mistificar e Me diga para despreocupar. E eu usaria palavras suas para dizer que o mundo não está são, mas que ele passou a ficar melhor depois da sua chegada. Espatódea, gineceu. Você e eu. Também usaria as suas notas para mostrar a alguém que estou apaixonado. Usaria as suas letras para fazê-la voltar, para ela ir embora, pra roupa secar, pra ela passar bem.
Tinha um corpo e o usava. Fazia o que queria e o povo falava, falava, falava. Ela fazia, fazia, fazia. Fazia bem. Falavam mal. Repetia.
Saudade de nós dois deitados na minha cama de solteiro. Vontade de sentir o meu corpo todo sendo revelado pelas tuas mãos. Desejo de ter o meu pescoço marcado pelo teus lábios. Eu apagava a luz, ligava o som e tirava a roupa pra você. Algumas vezes, não ligava o som. Outras, não apagava a luz.
Sentado à mesa, o operário sustentava nas mãos a xícara com a borda trincada. Tomava água quente. Minutos antes, havia contado as moedas: havia dinheiro para o chá; contou os degraus: não havia disposição para descê-los. O gato maldito roçava por entre as suas pernas e ele não tinha forças para afastá-lo. Sempre que podia, jogava o gato pela janela. O gato não morria. Viu na tevê que se jogasse o gato a uma altura ainda menor, maiores a chance do bichano se machucar. Então, o operário passou a visitar os andares inferiores. O gato não morria. O operário não entendia por que o animal insistia em regressar. Não o amava e, primordialmente, não o alimentava. Pousava a xícara sobre papéis que continham a sua assinatura. O operário desconfiava que não sabia mais escrever. Em todos os lugares, pediam 'assine aqui', 'na linha pontilhada', 'logo abaixo do xis'. Era só o que o sistema pedia: o seu desgraçado nome. Seu nome era a sua sentença. Surpreendentemente, o sistema era mais mecânico que a máquina que ele comandava. No trabalho, apertava sempre o mesmo botão e, para não cair numa rotina, alternava o dedo mestre entre o indicador e o anelar. Sabia que em pouco tempo seria substituído por outra máquina e outra e mais outra. Seria interessante para o sistema se ele deixasse de existir. Não entendia as regras, mas eram imposições do sistema que estavam além de qualquer questionamento. O sistema estava acima de tudo. O preço